sábado, 7 de outubro de 2017

Carta da Chegada

Querido amigo,

Estava de partida para Montevidéu e a mera expectativa de voltar me deslocara os sentidos. Senti-me preenchida e ao mesmo tempo agitada. Não poderia supor o que me esperava na cidade que mais gosto da América do Sul [tampouco sei agora]. É como se fosse a primeira vez.

É a primeira vez desde muito tempo. É a primeira vez sendo quem sou agora. É a primeira vez sendo outra. Um sorriso se ocupa do rosto enquanto vejo a Rambla desvela a cidade diante de mim.

De súbito me dou conta de que nunca estive aqui com Caio Marques [não sei porque ele veio agora]. Talvez porque sempre quis partilhar esse lugar com ele. Gosto de compartilhar meus lugares especiais com quem amo.

Surpreendo-me ao perceber que o amei. Quase preciso dizer pela primeira vez, em voz alta que o amei. Hoje soa ainda mais estranho do que quando aconteceu nosso encontro espalhado em sete cidades.

A cidade de ruas largas e imenso céu azul clama minha atenção, entrego-me à ela completamente. E a percebo como nunca antes: Uma cidade sem montanhas, morros, serros ou montes. Uma cidade plana, aberta. Cidade livre de muros. Sinto o vento tocar suave meu rosto pela ventana del auto. Libre.

A carícia suave me transporta para a primeira vez. Foi amor, não tenho dúvidas. Ela não se esforçou nada para ganhar minha atenção. Era madrugada de inverno. Estava, como agora, no táxi. Com olhos curiosos pelo primeiro encontro. Senti o ombros se abrirem, os olhos acenderem diante da beleza da beira rio iluminando a noite.

O charme anos cinquenta da cidade me tomou completamente. Senti-me parte desde esse momento. Era como se a conhecesse por toda a vida.

Em Montevidéu sinto-me em casa a cada lembrança, mesmo que hoje seja outra. A outra que sou quer desvendar as novas sensações de suas sentimentalidades ocultas, de seus subsolos e das curvas suaves como o som da voz das pessoas, de cada uma das pessoas com quem me encontro aqui. Quero sentir a outra Montevidéu diante de mim.

Tenho a curiosidade infantil por olhar nos olhos e sentir completamente desde os aromas até os sabores e texturas neste princípio de primavera por aqui. Quero dançar com a cidade, para a cidade, na cidade, nas praças, nas ruas, por todo lado.

Como se fosse a primeira vez, caio de amores por esta cidade que poderia ser minha para sempre. Desabrocho para ela como ela se abre para mim, plena de luz, cor e sorrisos fartos. E vejo traindo minha natureza ao entregar meu amor antes ao lugar que às pessoas. Aqui pessoas e cidade se fundem e se confundem numa delicadeza simples e doce.

Talvez quisesse trazê-lo aqui, querido amigo. Talvez quisera que viestes por teus próprios pés. Talvez tu nunca pudesse entender meu amor por esse lugar, talvez... Tu que amas as montanhas, sequer possa imaginar o que é enamorar-se das pradarias. Só talvez.
foto: Júlia Tourinho

Não há como saber se não viver.



Por um instante, se abre a Rambla com seu imenso céu azul de fundo. O mesmo azul reluziu em teus olhos diante dos meus no tapete da sala naquela tarde de agosto. Fico com teus olhos me fitando fixos e isso compõe a paisagem que suave me convida à entrega. Sinto-me plena.







Deixo-te agora, para viver e fluir o reencontro de um grande amor.

Que os ventos frescos das montanhas te envolvam com ternura e afeto como pernas ao redor do corpo quente;

Que a brisa fria de primavera desta parte do mundo me acolha em seus braços enquanto o sol aquece o frio que levanta os pelos dos meus braços sem teus abraços.

Que nos encontremos breve e possamos juntos partilhar do Amor que nos nutre nos lugares para onde vamos em dias de encontro com nossas almas puras. Sem apegos, com afetos.

Tua,

Anita




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