domingo, 28 de novembro de 2010

Blog da Maria: A Menina e a Concha

Blog da Maria: A Menina e a Concha: "Querida R., Sinto saudades de algo indizível que tive e perdi. Sinto saudades do afeto, sinto saudades de ti. Sinto-me feliz por lê-la re..."

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Alberto Tibaji: Querida Anita

Alberto Tibaji: Querida Anita: "Confesso, Anita.Sua última carta me desarrumou. Algo me dizia que você desconfiava da minha traição. Confesso.Tenho roubado incessantemente ..."

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O Ipê - Resposta a Caio Marques

Foto: Clarita Rickli
Caio,

O Ipê e seus ciclos. Há tempo de florescimento. Tempo de beleza e fulgor. Há tempo de folhas caídas, flores derramadas. Há tempo de galhos magros estendidos para os céus. O Ipê e seus ciclos. Serão os relacionamentos verdadeiramente intensos como os Ipês? - pergunto-me. 

Tivemos todos os tempos. Passamos por cada temporada e agora, mais uma vez, galhos secos estendem-se para o céu, enquanto flores murchas adubam as raízes. Somos Ipês? Por quanto tempo nossas flores - idas e vindas - ainda nutrirão o Ipê?


Não sei, mas gosto da perspectiva de sermos Ipês. Assim, já nem sinto saudades, nem mágoa das flores que caíram sem que eu pudésse sequer tê-las registrado. Dá-nos um sentido de percurso, movimento ininterrupto e livre, dentro de uma ordem natural de coisas. É, gosto de sermos Ipês.

Sejamos Ipês (será que meu humano egoísmo suporta?) floridos ou nus. Sejamos hoje o que somos hoje. Felizes com flores e sem flores. 

Reflexivo afeto,

A. L.



sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Carta de Anita Lopes a Caio Marques - O Fio

Caio,

Todo o silêncio e a distância alimentados durante  os últimos meses ajudaram a ver o quão difícil seria retomarmos o que tínhamos. A viagem para o outro lado do oceano me mostrou  a força das raízes e das origens, os sabores do velho mundo de onde vim a tantos anos fez me viajar em cada acorde de um fado, que longe tocava pelas ruelas do lugar, lembrando-me Alfamas. No entanto, a volta nunca é um retorno, é na verdade um novo caminho. E não creio seja possível constituir um novo caminho contigo, por que agora falta entre nós componente essencial em qualquer relação: a confiança.

A confiança é um fio firme e delicado que uma vez rompido não é possível restaurar sem macular sua delicadeza. É sempre um arremedo, um remendo, um nozinho, uma colagem, um qualquer coisa que tenta, tenta e não consegue dar segurança. O fio entre nós foi rompido e é certo, por mais que tentássemos , jamais conseguiríamos fazê-lo puro e sutil como antes. 

Fostes a lembrança mais presente nos passeios que fiz nesses meses e fostes a ausência menos sentida. Estive em paz comigo até que fantasmas teimaram em aparecer numa noite clara e cálida. Foram eles que sussurraram entre dentes apodrecidos que a confiança não se poderia restabelecer. Despertei suada, com uma tristeza funda querendo assaltar minha alma. Não permiti! Não permitirei que me roubem a alma, que me tirem a paz. 

Somos o que escolhemos - eu e tu - sem meias palavras. Escrevemos nossa história com todas as letras. As palavras que compuseram essa canção foram minuciosamente selecionadas. Foi uma composição a quatro mãos. E tu? Juntastes um punhado de letras bastardas, dessas que vagueiam de casa em casa, sem lar e escrevestes T-R-A-I-Ç-Ã-O. Com o passar do tempo descobri palavras ocultas, esgueirando-se pelas entrelinhas de ano e dia em meias verdades, numa vida dupla: M-E-N-T-I-R-A!?

Como podias esperar que com um punhadinho de versos doces e promessas fúteis pudésse apagar completamente as palavras vadias  que teimastes em colocar em nosso samba. Uma palavra  cantada não volta atrás. Novos versos não aplacam a banalização de uma letra. Apagar, talvez ajude, mas o papel estará manchado pela afoiteza de atravessar o samba com tão ordinária letra.

Sinto, sinto muitíssimo, mas o samba que quero sambar com minhas sandálias de prata é outro. É samba-canção, samba devotado, quase reservado, é samba de avião. Por isso, meu caro Caio, deixa-me agora enquanto ainda nos resta algum sorriso para compartilhar e, até espero, algumas cartas para trocar.


Com afeto,

A.L.






terça-feira, 22 de junho de 2010

Bilhete

C.,

Já não sei o que sinto, nem mesmo tenho certeza de quem fui ao seu lado. Não sei tampouco quem sou agora, diante das revelações.

Perdoe meu silêncio por um tempo que não saberei precisar qual será, mas que certamente é necessário para compreender tudo o quanto li dias atrás, tudo quanto soube hoje de ti.

Até,

A.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Confissão

Querido Caio,


Não sei como dizer... Já não sabia,  agora urge contar-te. Meu coração se aperta. Já deveria ter compartilhado contigo. Mas não fui capaz. Não fui capaz porque meu coração se espreme no peito ao pensar que nossos vínculos, mesmo indestrutíveis, estão laceando. Mais precisamente, que o amor que sinto talvez já não seja o mesmo amor, assim como a flor do Ipê Rosa a cada estação já não é a mesma flor. Sinto falta de amá-lo assim, amiúde, intensa e incondicionalmente. Sinto falta de estar apaixonada irremediavelmente por ti. Por isso venho adiando o momento de dizer-te...

...Meus olhos encontraram outros olhos durante a última viagem.  Enquanto meu coração disparava, ainda que discretamente, entristecia-se solitário, sem ter com quem dividir o peso dessa perda. Perdi o amor que sentia, eu o vi escorrer por entre os dedos. Agora era fato: Meus olhos viram outros olhos.

Vinha sentindo a nuca aquecer-se em pleno inverno. Sentia um olhar insistente bem atrás de mim, frequentemente. Virei delicadamente a cabeça - mas não completamente - e vi. Vi aquele olhar acinzentado: intenso e expressivo a me mirar. Voltei-me novamente para frente, mãos úmidas. Não era possível. Não estava acontecendo - dividi com meus botões.

Os dias se passavam e aqueles olhos ainda aqueciam minha nuca. Não era apenas uma sensação. Quando me virava lá estavam os olhos dele me fitando fixamente, com lábios que ensaiavam um sorriso incerto. As noites também passavam, aqueles olhos não tinham nome, nem voz e mesmo assim estava convicta de que já os conhecia, mesmo sem jamais tê-los visto antes.

Buscava-te em vão na caixa de correspondências. Gritava seu nome em silêncio e não me ouvias. Supliquei tua atenção, mas estavas ausente. Completamente ausente.

Último dia, após o trabalho intenso, saímos todos a comer e a beber juntos. Saímos para confraternizar e comemorar o êxito de nossa empreitada. Lá estavam eles a me fitar. Não pude deixar de retribuir o olhar, ainda que por alguns segundos apenas. Deixara, quase sem querer, escapar um sorriso contido, encabulado. Sorriso de menina.

Encontrei aqueles olhos acinzentados. Despedimo-nos numa esquina próxima ao meu hotel, lugar em que me deixou após o jantar, como il faut, e a promessa de nos vermos breve e muitas coisas para contar.

Foi assim. Suave e terno. Apenas olhar, leve embriaguez e sorrisos, mas foi. E agora que vens, devo adverti-lo que também ele estará na cidade nesse período. Chegará daqui a dois dias. Não sei se nossos olhares serão cúmplices novamente, mas nossa correspondência incessante indica que, de sorrateiro e tímidos, nossos olhos brilharão mais intensamente.

Não sei ser como tu. Não sei ser fragmentada, meus olhos se voltam apenas para um olhar por vez. Sou inteira em todas as minhas relações. Sigo inteira contigo, amando-te incondicionalmente como um dos mais ternos e próximos amigos que já tive. A vida segue, afinal. 

Sua amiga sempre,

A.L.

domingo, 16 de maio de 2010

Carta a K.

Querido K,

A viagem foi fantástica e a cidade não chegou a me surpreender. Uma cidade, é apenas uma cidade. Há peculiaridades poéticas, ruas com túneis verdes por onde o tempo passa mais lento, pôr-do-sol à beira do rio-lago, gente muito diferente de nós, com bochecas rosadas em vez de pele vermelha.

O reencontro foi espantosamente acolhedor. As memórias de minha meninice vieram habitar a conversa regada a café quente, broas, tortas salgadas e geléias. As paredes da casa, acreditas, eram vermelhas. Depois de décadas havia ainda afinidades entre nós, afinal.

Ela constituiu família, daquelas bonitas famílias que têm dois filhos, um carro na garagem, cachorro e férias na praia, mas continua exatamente como me lembrava: sorriso largo, olhar quase infantil.

Fizemos a retrospectiva dos anos vividos à distância, contamos dos rumos que tomamos, enquanto sorvíamos o café quente em meio à noite fria.

Quando, por fim, se fez silencio entre nós me deixou no hotel, exatamente onde me apanhara. Abraços, despedida e promessas de não nos perdermos mais. O reencontro, K, foi assim. Simples e tranquilo como ela mesma.

Hoje o vento frio está cortante e eu já me preparo para o retorno. Confesso-te que sinto falta da vibração de nossa cidade e da alegria de nossos passeios. Sinto falta do calor da gente daí, aqui a distância e o clima frio afasta as alma e a solidão aborrece mesmo em meio à multidão.

Prepara-te para minha chegada com um abraço acolhedor que possa reaquecer meu espírito e enxotar a solidão que se alojou em mim por aqui.  Estás pronto?

Anita.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Para Caio

Caio,

Uma tristeza profunda alojou-se em mim. Há semanas, no caminho de casa para o trabalho, observo - extasiada - um certo Ipê cor-de-rosa. Ele é lindo e fica na subida de uma curva pela qual obrigatoriamente tenho de passar todos os dias. Sob o sol morno da manhã, tendo o céu profundamente azul de fundo, resplandece aquela árvore linda, braços abertos em direção ao céu, carregada de flores rajadas de branco e rosa. Todos os dias prometia a mim que iria fotográfa-la. Chegava a avaliar o melhor angulo conforme ia fazendo a curva. Ela estava lá todos os dias. Todos os dias eu a mirava. Todos os dias desejava fortemente registrá-la. Todos os dias.

Ontem, no entanto, dei-me conta de que ela já não resplandece. As poucas flores que restaram pendem murchas em seus galhos magros, suplicando a atenção dos céus. Perdeu o viço, o Ipê. Passou seu tempo de florescimento. Foi definhando com o passar dos dias e eu, nem notara, acostumada que estava a tê-lo ali, todos os dias, lindo para me dar bom dia. Achei que seria sempre assim. Que todos os dias estaria ali para mim. Ao alcance das mãos, ao alcance da camera. Não foi assim. O tempo de florescimento acabou. Agora, recolhe-se para se reinventar e só daqui um tempo poderá florescer novamente.

Mas as flores do próximo ano não serão as mesmas flores. Não será o mesmo Ipê, este que admirei por tanto tempo, este que desejei diariamente poder registrar - e não o fiz - em lugar dessas  flores estarão outras, certamente lindas, mas já não serão essas. Esse Ipê que apreciei por tantas semanas, certamente já não será o mesmo no próximo ano. Perdi a oportunidade. Achei que ele estaria sempre ali, esperando por mim, braços abertos, disponível, mas a temporada passou. Ficou apenas na memória. E a memória com o tempo irá apagar os detalhes rajados das flores, as mãos extendidas para o céus, o viço, a força. Um dia o Ipê será apenas vaga lembrança, já não o terei mais.

Sem mais delongas, Caio: Estamos perdendo a oportunidade? Será que estamos nos deixando para o dia seguinte? Adiando o quê? Será que acreditamos que somos para sempre assim? Será que somos? Talvez seja meio mórbido, mas em algum momento um de nós já não estará e teremos vivido uma vida pela metade - ou sequer teremos vivido. Serei apenas eu a pensar no que passa? Ou será que para ti nada passa? O que passa?

Abraço,

Anita

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Carta I a Camarada Rosa

Camarada Rosa,

Depois daquele chá passei dias e noites a refletir. Sim, também eu sonho como a união de amor e de intelecto. Preciso admirar a mente daquele que comigo compartilha os dias e as noites. Ainda assim, não posso deixar de notar que o desejo de ser quem sou, de ir e vir sem limites, de permanecer quando queira, mina qualquer possibilidade de realização desse ideal romântico que teima em volver. Então será que compreendo o sentido de compartilhar? Será que idealizo essa união de corpos, mentes e almas? Há coerência entre o sonho e meu transitar no mundo?

Confesso, camarada: não sei. À distância essa conjunção plena é o único caminho possível. No entanto, quando a realização se aproxima, sinto crescer em mim um muro de tijolos invisíveis que vai subindo lenta e magicamente até o limite de impedir-me a respiração. Sinto-me sufocar e logo quero distanciar-me, mas, à distância, de novo a saudade da plenitude e do encontro de corpos, de almas e de mentes.

Tal incoerência faz com que me senta inadequada. 'Não pertenço a este mundo' . Se por um lado, o ideal me aproxima incovenientemente das mulheres que, mesmo numa época de revolução, permanecem adormecidas e submissas ao sistema de dominação patriarcal e de classe que ora vige. Por outro , a liberdade de pensamento e de conduta que almejo e mesmo que exercito, me aproxima das camaradas revolucionárias. Eu, em meio à controvérsia, vienho debatendo-me há muito entre razão e emoção, sem dar-me conta de que talvez, apenas talvez, o mundo não precise ser uma coisa ou outra, e sim, uma coisa E outra. É possível, essa é a tese que venho sustentando intimamente, que nossa vida, afinal, não seja uma sucessão de escolhas excludentes, mas de uma conduta includente que possa acolher amorosamente a diversidade em todos os seus vários sentidos.

O chá naquela tarde da última primavera em Berlim , confortou-me a alma. Finalmente já não era a única que se retorcia em tal controvérsia e que considera a hipótese - ainda pouco definida - que o acolhimento dea diversidade possa ser, afinal, um caminho igualmente válido e - quem sabe - mais revolucionário que a própria revolução de classes. Não me refiro apenas ao acolhimento à diversidade poética, mas a aceitação e o respeito real pela diferença, inclusive às diferenças ideológicas e políticas.

Pergunto-me há bastante tempo porque a vida tem de ter um ''lado'''? Porque estar em um lado elimina a possibilidade de estar em outro. Não seria essa uma forma de alimentar a competição tão própria do sistema capitalista? Não há um caminho do meio?  Sei que as idéias que ora exponho - compartilhar? - poderia ser partilhada com ninguém mais. Não conheço quem hoje pudésse compreender  tais reflexões, mas tu, camarada Rosa, estou certa, entende a tormenta que toma minha mente e meu coração. 

Espero pelo dia em que possa declarar que sonho com uma casinha com flores na janela, em que compartilhe idéias e afetos com aquele que admiro e amo. Sei que tu, camarada, também por isso anseia, embora não seja compreendida por aquele com quem vem partilhando as lutas e os afetos, as idéias e os sentimentos.

Deixo-te, camarada, esperando que esta reflexão te encontre forte em tuas convicções e aberta às novas reflexões, sempre.

Anita

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Ao Caio Marques

Não. Não vivemos juntos, Caio. Viver junto no sentido que trazes é compartilhar planos e sonhos. Nós, por um breve espaço de tempo, compartilhamos o teto, os dias, as refeições, a rotina, a empregada e o endereço. Não, nós não vivemos juntos jamais.

E nesse sentido percorro aqueles dias olhando atentamente para cada instante, buscando um olhar realista para o que vivemos. Sonhei por nós dois, planejei por nós dois. Nós vivemos aqueles dias juntos, cada um a seu modo, cada um vivendo sua própria fantasia, vestindo sua própria realidade.

Talvez tu te chames Ishmael e não Caio. Talvez eu tenha criado Caio para ser a imagem e semelhança de minhas fantasias. Caio então teria tornado-se tão real que de criatura passou a criador? Teria reescrito nossa história segundo suas próprias expectativas? Ou talvez Ishmael seja criação dessa expectativa por um companheiro para quem fazer planos - e realizá-los - seja igualmente um valor a ser experimentado. As palavras, sempre elas, mesclando fantasia e realidade, virtual e atual fazendo de um, outro a depender do campo léxico de quem escreve, do vocabulário de quem lê.


Afastamento, talvez essa fosse a palavra mais apropriada para o que se deu conosco. O convívio entre realidade e fantasia tornou necessário o afastamento e assim aos poucos nós tomamos caminhos tão distintos.

Talvez, e é assim que tenho sentido, a fantasia tenha se tornado verdade ainda que tardia. Mas como posso sentir por você? Não sei sequer o que realmente sinto - ou quero de nós dois - hoje que estamos tão distantes. Como poderia saber dos seus sentidos? Há sentido no que vivemos? Há sentido no que viveramos?

Há sentido em nos mantermos em contato? Sentido não sei se há, mas sinto quase uma necessidade de te ler, de compartilhar contigo o que em mim se passa.

Seja Caio, seja Ishmael, call me Anita. Anita Lopes, aquela que mesmo sem saber o que pode significar o amor, ama. Incondicionalmente ama. Instransitivamente ama.

Sempre sua,

Anita

sexta-feira, 16 de abril de 2010

XII Carta de Anita Lopes a Caio Marques

Caio,

Sua última carta me fez refletir longamente. Quem deixou quem afinal? Essa é uma pergunta que não havia me ocorrido. Talvez não nos tenhamos deixado, mas sim deixado a vida nos levar para onde ela queria que fossemos. Talvez tenhamos permitido tal estado de coisas para não termos de decidir sobre nós. Era mais fácil para ambos deixar que tudo corresse como se destino fosse.

É possível que se fizer uma auto-análise mais cuidadosa possa chegar à conclusão que minha partida tenha sido uma espécie de revanche, mas sendo assim, terei me sentido abandonada por você quando de sua ida para o norte?

É possível, mas, de certo modo, injusto de minha parte, pois nunca fizéramos planos. Você nunca me prometeu nada. Na verdade vínhamos vivendo a paisagem, deixando que a trama fosse mais importante que o desenlace. Jamais faláramos sobre o que queríamos afinal de nós dois, ou mesmo o que sentíamos realmente.

Era bom. Simples assim. Estar com você era muito bom. Compartilhar momentos, idéias, boas refeições era maravilhoso. Poder expor todas as angústias e ansiedades que a paixão pelo trabalho me impunha depois de longas e desgastantes discussões era especialmente acolhedor.

Mas nossa trama não tinha teia que a sustentasse, a ausência de planos comuns nos fez tomar rumos muito diferentes. Hoje, morando tão longe de ti, percebo que talvez não houvesse mesmo outro caminho para nós. E tenha de me confortar com as cartas que trocamos vez ou outra.

Talvez – é quase certo – você não se adaptasse a esta cidade. Ela não é para você, embora muito aqui me lembre nós dois e a vida que não vivemos. Ás vezes sinto saudades de tudo o que fomos um para o outro e de tudo o que poderíamos ter sido, e não fomos. Sinto falta das viagens que não fizemos, das idéias que não compartilhamos, dos abraços que não demos. Sinto falta, dos sonhos não sonhados e dos planos não realizados. Sinto falta do que poderíamos ter sido. Não fomos.

Walt Whitman tem um poema em que fala sobre a estrada que não tomamos. Sim, estive pensando sobre a estrada que não tomamos, mas isso de nada nos adianta agora. Nada pode nos ensinar, senão que não estamos juntos, não há nem trama, nem paisagem para nós agora. Só distância.

Olhando para a estrada que tomei, não chego a me arrepender. Ela me trouxe a esta magnífica cidade, me aproximou de pessoas especiais que não teria conhecido se nossas circunstâncias fossem outras. Conhecer K., Maria e d. Maroca foi realmente especial para mim. Tem sido enriquecedor, e o novo trabalho estimula a criatividade, embora por vezes me deixe algo insegura.

Mas isso já é outro assunto. Vou deixando-te por aqui. Cheia de saudades da estrada que percorremos juntos, deixando para trás o caminho que não fizemos.

Sempre sua,

Anita