Querido Alberto [ou serás Caio X?},
Sinto-me transbordar. Tanto tempo sem essa sensação. O tempo voa e em suas asas planas equilibram-se histórias de um passado remoto, que teimam em ressurgir. Em vão. Meu momento é agora... e nesse tempo transbordo.
Sou toda emoção desde alguns dias quando num tropeço encontrei [me]. Sim, em meio à multidão encontrei [me]. Foi rápido e fugidio o encontro. Foi mesmo surpreendente e pareceu passageiro. Mas não foi. Algo de mim ficou, algo veio comigo para casa - refúgio das minhas sentimentalidades escondidas - e guardou-se tentando adivinhar o devir.
Veio comigo e assim foi. E é [mas o que seria?]. Juro que não saberei nomear, mas sei sentir e sinto. São sensações contraditórias e o corpo é o mensageiro delas. Calor e frio se alternam no tempo/espaço desse devir [ou seria o contrário]. Há um impulso e o pulso. Sim, o pulso pulsa esses sentidos sem nome, sem respostas e sem perguntas.
E vive a incerta certeza de ir aos poucos se entregando ao transbordar. As certezas [há certezas!] estão ali, expostas como veias abertas e eu olho fixamente para elas. Não há respostas possíveis, nem questões prováveis. Não há margem para perguntas, sequer chego a ter dúvidas. Então, apenas olho. E dou-me conta que a criança de cinco anos às voltas com suas infindáveis indagações, aquietou-se. E seu silêncio dá espaço para o sentir simplesmente. E sinto. E no sentir uma menina travessa faz estrelinhas no corredor infinito, conclui de pé o exercício, bochechas rosadas: suada, feliz e de pé.
A mulher que gosta de balanço a tudo observa e sorri seu sorriso sereno. Tudo parece estar onde está. E assim é, querido Alberto. E assim tem sido dias passados. E de ti, que podes dizer?
Sua [sempre]
Anita
Anita escrevia cartas, a grande maioria delas para Caio Marques, um homem que influenciou evidentemente a vida e algumas importantes escolhas dela. Compartilhava idéias e sentimentos quase compulsivamente. Quem é Anita Lopes?
sexta-feira, 27 de abril de 2012
segunda-feira, 2 de abril de 2012
Resposta ao Desconhecido I
Moço,
A semente guardada [no peito] já definhava quando tuas perguntas silenciosas surgiram diante de mim e... Nem queira saber.
A verdade é que chegaram feito vendaval, deslocando todas as certezas absolutas, deixando um rastro de dúvidas, um caminho marcado de incertezas mudas.
Ainda assim, sabe-se lá o porquê, plantou-se um sorriso no canto da boca e estrelas vieram morar em meus olhos [aqueles mesmos que te revelaram tanto]. Sorrateiras, iluminaram os cantos escuros, desvendando sonhos que não sabia ter.
Há um vento frio percorrendo todo o corpo, vindo não sei bem de onde, indo em direção à boca [do estômago]. Há um arrepio incerto nesses sentimentos tortos. Prosa ou poesia? E as interrogações dão crias e a imaginação voa alto [e fundo], fazendo piruetas no (m)ar.
E eu, que por tanto tempo esperei o inesperado, ouço tua voz nas letras lidas e nem sei tua sonoridade. Mas não importa. Aí há quem escreva cartas, aqui também.
A.L.
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